Erro de cálculo: Dilma mediu mal o potencial bélico de Cunha e perdeu também para Temer
A presidente Dilma Rousseff (PT) mediu mal quem escolheu para inimigo – ou adversário, para tratar com um eufemismo. Desde os tempos de líder do PMDB, no já longínquo 2014, Eduardo Cunha (RJ) mostrava que não daria trégua para a petista. Tanto que, antes da eleição do peemedebista para a presidência da Câmara dos Deputados, a própria Dilma tentou viabilizar a candidatura rival de Arlindo Chinaglia (PT-SP). Apostou alto. E perdeu. Ali, a justificativa pública que Cunha precisava para partir para ofensivas cada vez mais duras apareceu – nos bastidores, indicações não atendidas para cargos e investigações contra o peemedebista contribuíram para azedar a inexistente relação. Nesse cenário, Dilma, quase sem trato político, deixou o vácuo necessário para que um ás regimental ocupasse espaço. Enquanto Cunha tinha um exército de seguidores, o Palácio do Planalto apostava em articulações equivocadas. Tentou até mesmo envolver o vice-presidente da República, Michel Temer, que foi alçado à condição de coadjuvante pela própria Dilma. Um coadjuvante de luxo, para falar de maneira mais branda. Temer, presidente do PMDB, maior força parlamentar do Brasil, e conhecedor profundo dos subterfúgios da Câmara dos Deputados, ganhou então as razões para romper com a presidente. Cunha e Temer, companheiros de longas datas, juntaram a fome com a vontade de comer. Tornaram-se protagonistas na derrota de Dilma neste domingo (17). Por 367 votos, a oposição admitiu o processo de impeachment da petista e encaminhou o processo para o Senado, responsável agora por julgar, em definitivo, a aplicação da cassação ou não do mandato da presidente.
O Brasil amanhece nesta segunda-feira (18) com um gosto de ontem na boca. Até o Senado votar a aceitação do pedido de impeachment, o país tem uma presidente, que vai funcionar como chefe de Estado, nos moldes de uma República parlamentarista. Só não é esse o caso brasileiro. O tom dos deputados de oposição era de dúvida quanto à reação de Dilma no pós-votação na Câmara. Como costumam citar, é imprevisível. A derrota dela, no entanto, não sepulta completamente o projeto “lulo-petista” (um neologismo casual) no país. Como frisaram os governistas, ainda que abatidos pela derrota, o governo perdeu uma batalha. Porém, a partir de então, se armou para a guerra. E, enquanto já ribombavam os tambores dos adversários, Dilma dormia. Acordou. Um pouco tarde, mas acordou. Chamou outros coadjuvantes de luxo, a exemplo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e do ex-governador da Bahia, Jaques Wagner, para restringir a duas figuras conhecidas da Bahia, e terá que fazer uma contraofensiva. Se não salvar a própria pele, salva a própria história. Apesar de que, ao longo da semana, a própria presidente se disse uma carta fora do baralho caso amargasse uma derrota. Se o Brasil amanhece com um gosto estranho na boca, Dilma está um pouco pior.