Escutas indicam que milicianos de Rio das Pedras recebiam informações privilegiadas sobre operações
Trechos interceptados de ligações telefônicas envolvendo milicianos de Rio das Pedras, obtidos pelo G1 nesta quarta-feira, indicam que o grupo recebia com antecedência informações privilegiadas sobre ações policiais na região. As escutas foram realizadas pelo Ministério Público do Rio com autorização da Justiça.
Um dos presos na operação de terça-feira, Manoel de Brito Batista, conhecido como Cabelo, que aparece fazendo ameaças em várias ligações, recebia informações de policiais e era responsável pela negociação e “pagamento de valores espúrios”, de acordo com a denúncia do Ministério Público, para que a milícia pudesse cometer crimes sem ser incomodada.
No total, 13 foram denunciados pelo Ministério Público, e cinco foram presos na Operação Os Intocáveis na terça-feira (22). O grupo é suspeito de comprar e vender imóveis construídos ilegalmente na Zona Oeste do Rio, além de crimes relacionados à ação da milícia nas comunidades de Rio das Pedras, Muzema e adjacências, como agiotagem, extorsão a moradores e comerciantes, pagamento de propina e utilização de ligações clandestinas de água e energia.
Manoel de Brito Batista, o Cabelo, preso na Operação Os Intocáveis — Foto: Reprodução
Em uma das conversas gravadas, no dia 15 de outubro de 2018, Cabelo diz que é ele quem dá o dinheiro para a polícia e que sabe quando eles iriam até a comunidade.
“Teve um Coroa lá no meio da rua quebrando concreto, eu já falei para vocês, só é para para quando eu falar, sou eu que dou o negócio pro homem e vocês sabem mais do que eu, eu que levo o negócio pro homem, eu sei quando vem, pô”, reclama Cabelo.
Em outro momento, ele diz, no dia 7 de novembro, que um policial do Comando de Policiamento Ambiental avisou que poderia ter alguma ação policial na região, apesar de não ter certeza.
Cabelo: Amanhã, o cara avisou lá do Cepan.
Voz masculina: Ham?
Cabelo: Acha que vai ter alguma coisa para cá, mas não tem certeza não.
Voz masculina: E aí?
Cabelo: Pode trabalhar, mas fica de olho, entendeu?
Voz masculina: Mas e esses caminhão tudo aí?
Cabelo: Não, ele falou que não tem muita certeza, não, porque não tem como ele saber porque eles falam que vão para um lugar e depois vão pra outro, entendeu?
Voz masculina: Disse que eles foram em Rio das Pedras hoje, será que vão lá de novo?
Cabelo: Falaram que, ele tem quase certeza que não é pra Muzema, é pro Rio das Pedras, entendeu?
Voz masculina: Amanhã, né?
Cabelo: É, estou falando para você ficar de olho.
Em outra ligação, cinco minutos depois, Cabelo e um homem identificado como Bruno conversam sobre uma possível operação na região feita pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e a Prefeitura do Rio no dia seguinte.
Cabelo: Tá sabendo que tem alguma coisa amanhã?
Bruno: Não, não tô sabendo não.
Cabelo: Acabou de me ligar aqui que vai ter.
Bruno: Aonde?
Cabelo: Muzema e Rio das Pedras, falou que não é, é p*ca, hein?
Bruno: O quê?
Cabelo: Falou que é Inea e prefeitura.
Bruno: Eu não aguento não, mano.
Cabelo: Inea e prefeitura, falou que os cara são do c*ralho.
Bruno: É?
Cabelo: Hum, hum, eu nem sei o que eu faço.
Bruno: Não aguenta o coração mais não, na moral!
Cabelo: E aí, procura ver se é verdade mesmo.
Escutas telefônicas reveladas pelo G1 nesta quarta-feira (23) mostram ameaças de milicianos contra quem contrariava seus interesses. Gravações também revelam a rotatividade forçada em imóveis controlados pela quadrilha.
Denunciados e presos
- Maurício Silva da Costa, o tenente reformado conhecido como Maurição, Careca, Coroa ou Velho – preso
- Ronald Paulo Alves Pereira, o major da PM conhecido como Major Ronald ou Tartaruga; segundo as investigações, é chefe da milícia da Muzema e grileiro nas regiões de Vargem Grande e Vargem Pequena – preso
- Laerte Silva de Lima – preso
- Manoel de Brito Batisa, o Cabelo – preso
- Benedito Aurélio Ferreira Carvalho, o Aurélio – preso
- Adriano Magalhães da Nóbrega, Adriano ou Gordinho, ex-capitão do Bope;
- Daniel Alves de Souza;
- Fabiano Cordeiro Ferreira, o Mágico;
- Fábio Campelo Lima;
- Gerardo Alves Mascarenhas, o Pirata;
- Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba;
- Júlio Cesar Veloso Serra;
- Marcus Vinicius Reis dos Santos, o Fininho.
Ronald Paulo Alves Pereira, major da PM, preso na Operação Intocáveis — Foto: Reprodução
Capitão Adriano, um dos denunciados da Operação Intocáveis, do Ministério Público e da Polícia Civil do Rio — Foto: Reprodução
Ronald Paulo Alves Pereira, major da PM, chega preso à Cidade da Polícia — Foto: Reprodução/GloboNews