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27 September 2024

Raquel Dodge quer suspensão de inquérito que apura ofensas ao STF

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, se posicionou a favor de um pedido feito em abril pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) para que seja suspensa a investigação do Supremo Tribunal Federal (STF) que analisa eventuais ofensas e a divulgação de fake news sobre ministros da Corte por parte de procuradores. Nas palavras de Dodge, o “inquérito instaurado representa clara investigação abusiva e sem respeito à legalidade”.
O procedimento do STF foi aberto em março pelo presidente da Corte, ministro Dias Toffoli. À época, ele justificou que a investigação teria de acontecer devido à “existência de notícias fraudulentas (fake news), denunciações caluniosas, ameaças e infrações revestidas de animus calumniandi (intenção de caluniar), diffamandi (de difamar) e injuriandi (de injuriar), que atingem a honorabilidade e a segurança do Supremo Tribunal Federal, de seus membros e familiares”. Um dos alvos do inquérito é o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava-Jato em Curitiba (PR).
Dodge condenou a investigação em parecer emitido na quarta-feira (31/7) e divulgado neste sábado (3/8). Nas 27 páginas do documento, a procuradora-geral da República destaca ao menos 20 irregularidades no inquérito do STF. Para ela, Toffoli desobedece “os princípios do juiz natural e da impessoalidade” e gera um “verdadeiro tribunal de exceção”.
“O presidente do STF, de ofício e em um só ato, instaurou inquérito criminal em claro abuso de poder, pois o Supremo Tribunal Federal não pode se confundir com órgão investigador, em vista do princípio acusatório. O ato coator é inconstitucional pois a competência constitucional para requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial é do Ministério Público”, destaca Dodge.
A procuradora-geral da República explica que o inquérito “padece de grave ilegalidade vez que impede o exercício do direito líquido e certo dos associados da impetrante (ANPR) de se manifestarem no exercício de suas atribuições constitucionais, bem como de terem seu direito fundamental à livre manifestação de opinião violado” e “representa uma violação ao sistema acusatório, vez que as funções de investigação, acusação e julgamento estariam reunidas em um só órgão, inexistindo supervisão do Ministério Público Federal no inquérito instaurado”.
“O inquérito instaurado representa clara investigação abusiva e sem respeito à legalidade, pois somente a própria Procuradoria-Geral da República tem a prerrogativa de investigar os associados da impetrante (ANPR)”, garante.

Relatoria do inquérito contestada

Dodge também aponta erros na escolha do ministro Alexandre de Moraes para ser o relator do caso e afirma estar diante de uma “situação inusitada, jamais experimentada por este órgão ministerial (Procuradoria-Geral da República)”.
“O sistema processual penal vigente no país impõe que, no curso de inquéritos, o Ministério Público atue durante a investigação, inclusive recebendo os autos periodicamente, ocasião em que analisará não apenas a legalidade, mas também a validade e a pertinência da prova produzida para a formação da sua opinio delicti (opinião a respeito do delito)”, detalha.
Dodge pede que “o STF se porte com autocontenção e racionalidade jurídica, sem se afastar dos valores que lhe cabe defender”.
“Ainda que se depare com crimes de gravidade notória, como o são os dirigidos contra seus próprio membros, o STF, ainda que movido pelo fim de combatê-los, deve se manter adstrito ao regime democrático, ao devido processo legal, ao sistema acusatório e às liberdades de expressão e de imprensa. Na verdade, é justamente quando colocadas diante de situações de extrema gravidade que as instituições devem agir em estreita subserviência aos valores cuja proteção lhe justifica a razão de existir, sem recorrer a exceções”, escreveu.

Pedido de arquivamento

Não é a primeira vez que Dodge se posiciona contra a investigação do STF. Em abril, a procuradora-geral da República já havia pedido o arquivamento do inquérito criminal, mas a solicitação foi recusada por Alexandre de Moraes.
Desde então, o ministro autorizou o cumprimento de mandados de busca e apreensão a computadores, tablets, celulares e outros dispositivos eletrônicos de pelo menos oito investigados pela Corte.
No parecer deste sábado, Dodge solicitou a interrupção do inquérito outra vez, com a concessão de uma liminar que suspenda os efeitos do procedimento. Caso o STF negue o pedido, a procuradora-geral da República solicita que “qualquer ato que envolva os Procuradores da República associados à impetrante (ANPR), seja previamente remetido para a Procuradoria-Geral da República”.