Teatro independente passa por dificuldades em Salvador
O Brasil é um país repleto de artistas, e em especial, a cidade de Salvador tem fama de que seus nativos já nascem estrela. Porém, o complicado é conseguir manter o “brilho” pelo resto da vida como fonte de renda.
No final de 2010 o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea realizou um pesquisa relatando que quase 60% da população brasileira nunca esteve em um teatro ou a um espetáculo de dança e cerca de 70% jamais frequentaram a museus ou centros culturais.
Estamos a menos de uma semana para o dia das crianças, e a agenda cultural soteropolitana está repleta de atividades artístico-culturais para os pequenos. Mas será que mesmo sendo em um período festivo, esses locais terão casa cheia?
Em entrevista com o diretor de teatro Gil Santana, atuante há mais de 20 anos na cidade, buscamos a sua opinião quanto ao assunto, haja vista que a sua experiência e persistência no ramo da arte independente provoca admiração.
Com a ascensão do cinema e da televisão, o teatro parece ter ficado a latere com o passar dos anos. Questionado sobre o que o motiva a viver do teatro em Salvador – que na realidade ainda é uma terra hostil para o desenvolvimento artístico independente -, Gil respondeu que se pergunta isso todas as manhãs quando acorda. Pois toda a classe artística está passando por um período complicado em Salvador nestes últimos anos. Ele por exemplo que possue um processo criativo que normalmente tem como resultado mais de 4 peças teatrais em cartaz por semestre, há alguns anos atrás já teve público de mais de 500 espectadores, hoje revela que o público tem diminuido bastante.
Também afirmou que atualmente os artistas precisam ficar a todo instante chamando a atenção do público, pois senão eles serão esquecidos. Disse que em estado de desespero, alguns chegam a fazer arte de graça para receberem visibilidade. Uma realidade que é constrangedora para a classe, pois assim o artista se desvaloriza e fortalece mais ainda a dificuldade de acreditar em seu próprio trabalho.
Sobre a relação governo e cultura ele explanou que ainda falta incentivo por parte do governo, e por isso o teatro se torna algo quase elitizado, devido aos valores dos ingressos que desmotiva a maioria das pessoas, pois a classe artística acaba sendo obrigada a manter entradas com valores altos devido ao pagamento de pautas caríssimas para estarem em cartaz.
Ainda sobre essa relação citou uma crítica referente aos editais. Há muitos artistas e companhias com uma produção de peso cultural considerável que se inscrevem, mas acabam não sendo contemplados, pois seus projetos são ofuscados pelos de empresas artísticas de maior porte, que também se inscrevem, ou para um artista qualquer que tenha mais público, somente por que assim o governo terá mais visibilidade. Nesse aspecto a arte não é vista como um entretenimento beneficiário para a população, mas sim como mais um modo desnecessário e irritante de angariar futuros novos votos pelo “reconhecimento popular das ações do governo”.
Gil ainda salientou que não adianta ficar simplesmente reformando praças e fazendo outras edificações urbanísticas, isso só vai dar ao povo um espaço revitalizado para certo tipo de lazer. Não o fará pensar sobre questões éticas e morais dentro de um contexto sociocultural.
E quanto a importância de outras linguagens artísticas, citou como exemplo o nosso maior festival público – que hoje pode ser considerado privado -, o Carnaval. “O governo dá muita atenção ao festival carnavalesco, e se esquece que isso é apenas uma pequena parte da arte em nossa cultura. O carnaval possui uma arte pautada na alegoria e não tem aspectos simbólicos que verdadeiramente eduquem e moralizem o povo, é fincada simplesmente na distração. O que na Antiga Roma era o ‘panis et circenses’, aqui em Salvador podemos chama-lo de ‘festa e cerveja’, se não no Brasil inteiro”, desabafou.
Questionado sobre como é fazer teatro para o público infantil, respondeu que é fantástico. “Uma criança que se emociona, nos emociona.” Em suas peças, seu elenco sempre interage com as crianças e, normalmente, elas sobem ao palco e participam ativamente da história. “Isso as encanta, as alegra e alegra aos pais também”, informou.
Gil Santana convidou a todas as pessoas frequentarem mais os teatros, a irem assistir as peças que rolam na cidade. Também pediu para as pessoas valorizarem mais a importância que as artes têm em nossas vidas, “pois, sem elas não teríamos como se expressar, tudo que nós criamos veio através de um processo artístico, e todo processo artístico requer emoções. No teatro, a experiência é vivida pelo público com o ator; no cinema e na televisão, a interação normalmente é morta porque é pura estética, de simples observação, muitas vezes até vazia”.
O campanhia Teatro Gil Santana – TGS está atualmente em cartaz no Teatro IRDEB localizado na Federação, nos sábados, domingos e feriados, com as peças infantis Os 3 Porquinhos às 15h00, e O Cavalo Transparente às 16h00.
Por Elton Soledade / Click Notícias