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27 November 2024
Rhayner e esposa (Foto: Reprodução)

Rhayner admite que usava drogas até ano passado: “Fumei maconha e vendi cocaína”

Jogador se converteu à religião evangélica em março deste ano e abandonou o vício

Na Toca do Leão, ele não tira o sorriso dos lábios. Rhayner vive a melhor fase da carreira. Titular absoluto do técnico Vagner Mancini, ele é um dos responsáveis pela vice-liderança do Vitória na Série B.

Foto: Reprodução

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A felicidade dentro e fora de campo foi conquistada após superar um drama pessoal. Rhayner conta que já traficou drogas na adolescência e era usuário até o ano passado. “Eu fui viciado em maconha e cheguei a usar cocaína também”, desabafa. As palavras são fortes, mas ditas com a convicção de quem quer que elas repercutam. Aos 25 anos, Rhayner não esconde o passado. Ao contrário, faz questão de expor, para que futuros jogadores não caiam nas mesmas armadilhas.

A esposa, Mariel,  e a religião evangélica, para a qual se converteu em março, foram fundamentais para conseguir deixar pra trás uma história de altos e baixos, iniciada aos 16 anos, quando ainda morava em Barcelona, bairro do município de Serra, no Espírito Santo, onde nasceu.

Em entrevista exclusiva a um jornal local, Rhayner falou sobre a relação com as drogas e também sobre a boa fase que vive após Mancini ter mudado sua posição em campo. O então atacante virou meia do dia 8 de agosto pra cá, quando o Vitória venceu o Ceará, por 2×1, em Fortaleza. Após a mudança, Rhayner fez quatro gols e, com cinco, é o terceiro artilheiro do Leão na Série B, atrás de Elton, com oito, e de Escudero, que marcou dez.

Apesar da boa fase, você começou a escrever no blog da sua esposa (marieldarocha.com.br) sobre erros do passado e envolvimento com drogas. Por quê?

Eu converso muito com David, Flávio, Vinícius (jogadores recém-promovidos da base), porque sei o quanto esse deslumbre da subida para o profissional me prejudicou, o quanto é complicado e tem que ter a cabeça no lugar. Pelo que eu passei, desde o meu envolvimento com álcool, baladas, até envolvimento com tráfico, com drogas, pra mim foi muito complicado. Eu não tive esse suporte, alguém que chegasse pra mim e falasse ‘olha, sai desse caminho, vem pra esse que é melhor’. Eu não tive isso. Recebo muitos e-mails, muitas mensagens de pessoas que estão lendo meus testemunhos e levando como exemplo de vida. Fico muito feliz. É muito gratificante saber que, com palavras e histórias de vida, eu vou poder ajudar, quem sabe, alguns futuros brasileiros no futebol.

Quando você mudou de conduta?

Pra te dizer a verdade, este ano está sendo o diferencial na minha vida, porque é o ano que eu me apeguei, que eu me converti. Até o ano passado, eu ainda tinha envolvimento com droga e isso foi muito complicado. Este ano, no Vitória, eu digo que Salvador realmente me salvou, o nome da cidade diz tudo, porque aqui eu me converti, mudei minhas atitudes, meus pensamentos e, graças a Deus, hoje eu me sinto maduro o suficiente pra discernir bem as coisas e saber o certo e o errado, saber o que eu preciso pra dar continuidade a minha carreira.

Que tipo de envolvimento com o tráfico de drogas você teve?

Eu vendia também, além de usar. Eu vendia pra manter meu vício, vendia mais cocaína. Isso foi antes de eu iniciar minha carreira, eu tinha 16 ou 17 anos. No meu bairro, tinha muito tráfico. Quando eu comecei a jogar, eu larguei.

Quais drogas você usou?

Fui viciado em maconha, cheguei a usar cocaína também, entre outras drogas, como lança-perfume e outros tipos que são burladas pra não cair no exame antidoping.

Como você fazia para driblar o exame antidoping?

Quando eu estava jogando, eu não usava as drogas, porque poderia cair no doping. Na verdade, eu fazia mais essas coisas quando estava de férias.

De que forma as drogas atrapalhavam seu futebol?

Atrapalhava minha respiração e me deixava sem dormir.

Quando a pessoa é viciada em uma droga, ela sente falta, não?

Sim, sente bastante falta, mas eu não arriscava não, porque eu sabia que as consequências iriam ser grandes.

Você já foi treinar ou jogar sob efeito de alguma droga? Qual?

Já, já fui treinar. Com maconha, só. Em períodos em que eu não era relacionado, em que estava afastado, muitas vezes eu ia treinar desse jeito. Quando não tinha possibilidade de jogar, já aconteceu.

Então você só abandonou as drogas este ano?

Teve um momento no ano passado que eu tinha largado tudo, mas os problemas na carreira, no próprio Bahia… Eu não tinha a cabeça no lugar e passei um período difícil, fiquei quatro meses sem salário. Isso foi acumulando, acumulando e tive uma recaída pesada que me prejudicou mais do que já estava me prejudicando.

As drogas te atrapalharam no problema de indisciplina que teve no Bahia? Se arrepende?

Me arrependo. Eu não tinha muita noção do que era certo e errado. Pra mim, enquanto eu estivesse desempenhando bem o futebol dentro de campo, eu podia fazer tudo extracampo. Isso não é verdade, porque qualquer atleta depende do próprio corpo, de performance, e uma hora ou outra o acúmulo de noites sem dormir, de álcool, iria afetar o meu rendimento. Quanto afetou, desencadeou um monte de coisas que já vinham acontecendo. Foi um acúmulo de coisas e, quando estourou, estourou tudo de uma vez.

No ano passado, você usou drogas durante o período em que estava no Bahia?

Só quando eu saí mesmo. Quando eu fui afastado, fiz o desligamento, falei que não ia ficar treinando separado. Fiquei quatro meses desempregado. Eu tentava não me viciar, então usava só às vezes.

Que droga você voltou a usar na época e com qual frequência?

Maconha. Uma ou duas vezes por semana.

O que você fez para conseguir largar as drogas?

O principal foi ter voltado pra minha esposa e ela ter feito eu querer voltar a jogar futebol. Pra seguir na carreira e no sonho, eu resolvi parar de novo. O ponto principal também pra eu largar foi eu me converter.

O Ba-Vi do primeiro turno da Série B foi um divisor de águas pra você  no Vitória?

Sim. Antes do Ba-Vi eu vinha entrando no segundo tempo, mas não tinha muita confiança. Mancini falou que tinha pretensão de me usar pra botar um pouco mais de experiência em campo, porque eu tinha bagagem. Em um clássico, se você tem um bom desempenho e ajuda a equipe a vencer, isso te dá confiança. Mancini disse pra mim que a pretensão dele era me colocar de titular quando ele chegou, mas não podia fazer isso pela fase que eu estava vivendo, que ele não seria ético com os outros jogadores. Depois daquele jogo, eu consegui me firmar e manter a regularidade. 

Como Mancini conversou com você sobre mudar de função?

Foi no jogo contra o Ceará, que eu comecei a jogar no meio. Uns dois jogos antes do jogo contra o Ceará, ele (Mancini) perguntou se eu jogaria um pouco mais recuado se ele tirasse Flávio. Até conversei com ele depois desse jogo que, como eu tenho facilidade de ajudar na marcação e velocidade pra chegar no ataque, eu poderia deixar a equipe um pouco mais veloz e com mais ofensividade sem perder na marcação. Aí ele falou que essa transição de levar a bola da defesa pro ataque era muito importante e que ele precisava de alguém pra auxiliar, já que  Escudero estava voltando de lesão, precisava de alguém pra fazer a transição mais rápida.

Do jogo do Ceará pra cá, você já fez quatro gols. Nessa nova função, você sente mais facilidade para balançar a rede?

É verdade. Durante o jogo, Pedro Ken fala muito comigo pra chegar perto do gol, porque uma hora ou outra a bola vai sobrar ali. Eu brinco muito com ele durante a partida, falando que agora estou poupando fôlego, segurando um pouco pra poder chegar com mais gás ao ataque. Antes eu corria muito pra trás e agora estou dando mais uma respirada no meio-campo e chegando com mais gás no ataque.

Sente-se melhor no meio?

Acho que sim. Eu me sinto bem jogando assim. Nos primeiros jogos que Mancini me colocou nessa posição eu agradeci a ele por ter notado isso, por ter visto que eu podia ter um desempenho melhor nessa função. Pode ser um diferencial, pois quando ele precisar de mim no ataque, vou poder ajudar, e quando precisar no meio, eu estou apto a fazer também.

Seu desgaste em treinos e jogos diminuiu?

Quando eu cheguei (ao Vitória) eu conversei com a fisiologia e fisioterapia que, pelo meu desgaste dentro de campo, eu demorava uns dois ou três dias pra me recuperar. E a gente sabe que não tem esse tempo pra ficar fora de treino, ainda mais com jogos um em cima um do outro. A gente fez um projeto de suplementação e alimentação que vem me ajudando muito no pós-jogo.

Ainda dá pra entrar na briga pela artilharia com Escudero e Elton?

Eu brinquei com Elton, porque ele falou que eu e Diogo estamos disputando quem toma mais cartão. Já fiquei três partidas sem jogar por causa de cartão amarelo (vai ficar a quarta), aí ele disse que eram as três partidas do gol pra estar encostado no Escudero como artilheiro. Durante os jogos eu não paro pra pensar nisso. Se os gols saírem, vou ficar feliz, mas se puder dar uma assistência pro Elton ou Escudero, pra eles se isolarem na artilharia, vou ficar feliz também.

Você já levou 12 cartões amarelos na Série B. Vagner Mancini te chamou a atenção por isso?

Já, eu já recebi bastante puxão de orelha. Até brinco que muitos desses cartões foram erros de arbitragem, mas o que eu tenho mesmo é que fechar minha boca durante as partidas, não encher o saco do juiz, porque sou muito chato. No jogo do Paysandu e no do Bahia, parecia que tinham colado minha boca, não reclamei nada. Falei pra mim mesmo que, independentemente do que acontecesse na partida, eu não ia reclamar. Isso aconteceu e acabei não tomando cartão, então vi que ser controlado faz bem pra mim.

O que foi essencial para o Vitória dar a guinada que deu após um primeiro semestre tão ruim?

A sinceridade da diretoria com a gente e a nossa união dentro do grupo, mesmo nos momentos mais difíceis. A gente se fechou, se uniu e acho que isso foi o diferencial.

Qual o papel de Mancini nesse novo Vitória da Série B?

Mancini é um treinador com mais experiência, que sabe lidar mais com o grupo inteiro, é sincero com a gente e usa muito a inteligência pra estudar os adversários. Essa inteligência e essa confiança têm muito a ver com o momento do time.

Mudar a diretoria foi essencial?

Quando eles assumiram eu até brinquei que não sabia que tinha mudado porque não tinha conhecido o outro presidente (Carlos Falcão). Desde que ele (Raimundo Viana) assumiu, sempre foi muito sensato nas coisas que falou pra gente. Ele é mesmo um torcedor. Depois dessa partida contra o Bahia, eu vi que ele estava com um olhar de torcedor, os olhos bem vermelhos, de quem estava chorando de alegria.

Você quer renovar contrato com o Vitória? Já conversou a respeito?

Não teve nenhuma conversa ainda, mas o carinho que eu estou tendo pelo Vitória, por ter sido o clube que mudou o meu rumo de vida, que a torcida tem comigo, por como a diretoria tem me tratado, pode pesar bastante na decisão de ficar. Vou aguardar e ver se começa uma conversa de renovação. Vou ficar muito feliz.

Por Daniela Leone | iBahia