Nascido de família católica, batizado com os nomes do pai de Cristo e do próprio filho de Deus, segundo a crença cristã, José Jesus se tornou ateu aos 18 anos por influência de um amigo que não acreditava nem no Deus cristão nem em nenhum outro. “É uma coisa que aborrece muito minha mãe, católica fervorosa. Acredito na coincidência das coisas, mas não aceito essa ideia de Deus acima de tudo, supervisionando tudo.” Ele conta que, até os 18 anos, frequentou a Igreja e chegou a fazer a primeira comunhão, conforme o ritual católico. “Aí cheguei naquela encruzilhada com muitos trilhos à minha frente e fiz a escolha. Descobri que o caminho mais sensato era o de ateu.” Curiosamente, José Jesus tem uma empresa com nome bíblico, Aarão Editora, que tem entre os clientes o Esporte Clube São Bento, de Sorocaba. “Eu leio a Bíblia e, quanto mais leio, mais ateu fico.”
Resposta. Para o bispo de Santo André, d. Pedro Cipollini, da Comissão de Doutrina e Fé da CNBB, essa situação é vista pela Igreja como efeito do pluralismo religioso cada vez maior. “Durante 400 anos, todo mundo no Brasil era obrigado a ser católico, como mostra a história. Hoje vivemos um regime democrático também na religião e é natural que, com mais opções, haja uma distribuição.” O ateísmo brasileiro não é agressivo ao ponto de fazer campanha contra quem acredita em Deus, segundo os bispos católicos. “Não me exponho, até porque, em alguns momentos, você pode ser prejudicado por suas convicções religiosas”, diz José Jesus. “Mas quando as pessoas tentam me convencer a deixar de ser ateu, aí não me faltam argumentos.” “É uma espécie de ‘indiferentismo’, desânimo. Pessoalmente, acho que não existem pessoas ateias”, rebate d. Pedro. “O ateu pode ter uma ideia equivocada de Deus.” Ele critica ainda uma “ideologia marxista” que teria tomado conta da educação no Brasil, não permitindo que se fale em Deus no processo educacional.
“Na festa junina da escola, pode falar da bandeirinha, da fogueira, mas não pode falar do santo da festa. Vivemos num estado laicista, que é deletério, porque proíbe falar de Deus, que é elemento constitutivo da natureza humana.” D. Pedro cita o caso de uma creche que, por ter um quadro de Jesus, foi ameaçada de perder a subvenção da prefeitura. “Se não fizermos nada, vai ser proibido falar em religião e não se pode educar uma pessoa sem falar no aspecto religioso.” Segundo ele, a Igreja trabalha na sua organização interna no sentido de fortificar a fé e dialogar. “Ela não pode abdicar do direito garantido na Constituição de professar a fé. Isso tem de ser defendido para que tenhamos um país democrático, com estado laico, mas também liberdade religiosa. O poder econômico só aceita um deus, o dinheiro, e para o sistema econômico a religião é um obstáculo.”
Para d. Jaime Spengler, arcebispo de Porto Alegre (RS), a queda no número de católicos decorre ainda de mudanças no conceito de família, no respeito às diferenças e à dignidade da vida humana. E é preciso refletir sobre a mensagem. “A fé cristã tem como referência fundamental a experiência do encontro com a pessoa de Jesus Cristo. A pergunta que podemos fazer é se nossas celebrações proporcionam isso.” Segundo o bispo, ao lado do decréscimo no número de fiéis, estudos recentes mostram um retorno de jovens à Igreja. O arcebispo defende uso maior da tecnologia de comunicação instantânea e meios eletrônicos para se aproximar dos fiéis. “Precisamos nos aprofundar mais no domínio desses instrumentos.”