Com dados escassos, estupros de LGBTQIA+ aumentam 88% em um ano
Os registros de estupro de pessoas LGBTQIA+ aumentaram 88,4% entre 2020 e 2021, mostram dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgados nesta terça (28). Em números absolutos, os abusos saltaram de 95 para 179 no período.
Outros dois crimes tiveram alta nas estatísticas. A lesão corporal dolosa (intencional) cresceu 35%, de 1.271 para 1.719. A notificação de assassinatos de LGBTQIA+ aumentou 7%, passando de 167 para 179.
Quando considerados os números absolutos de casos registrados, em 2021 houve 448 agressões, 84 estupros e 12 homicídios a mais do que em 2020.
Dennis Pacheco, pesquisador do FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública), ressalta que apesar de haver um aumento de registros, não é possível afirmar que houve aumento no número de casos, porque a alta das notificações pode significar, por exemplo, maior confiança para fazer a denúncia, trazendo à tona violências que antes não chegavam às autoridades.
“Uma das hipóteses é que o aumento do debate público em torno do assunto implicou o aumento dos registros, por causa de um sentimento de que poderia haver processamento devido à denúncia por parte das instituições de segurança pública”, diz.
Outras hipóteses levantadas pelo pesquisador, e que podem coexistir, são a possível influência da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) em enquadrar a homofobia na lei dos crimes de racismo, proferida em 2019, e o agravamento da violência de gênero e de orientação sexual.
Pacheco afirma que apesar da relevância, a qualidade geral dos dados de crimes contra pessoas LGBT+ é “baixíssima”. Isso porque muitos estados não têm uma rotina de monitoramento eficiente. O próprio anuário sofreu com essas lacunas.
As tabelas que compilam as informações levantadas pelo fórum apresentam trechos em branco. Nesses casos, os estados declararam não ter dados ou nem sequer responderam às solicitações dos pesquisadores.
Cinco estados não apresentaram nenhuma informação nem sobre 2020 nem sobre 2021: São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Maranhão e Rio Grande do Sul. Juntas, essas unidades federativas representam cerca de 46% da população brasileira, algo em torno de 98 milhões de habitantes.
A primeira pesquisa do IBGE sobre orientação sexual dos brasileiros divulgada no dia 25 de maio deste ano, feita em 108 mil domicílios, indica, por exemplo, que 2,3% da população do estado de São Paulo se declara homossexual ou bissexual, o equivalente a 1 milhão de pessoas. Ainda assim, não há dados sobre possíveis violências sofridas por LGBTQIA+.
“Produzir dados ajuda a produzir políticas públicas eficazes e focadas nessa população, mas o que temos no Brasil é uma cultura de políticas universalistas que reforçam essas desigualdades, ignorando as vulnerabilidades de grupos específicos, como é o caso da população LGBTQIA+”, afirma.
No Acre, por exemplo, o único dado disponível é de um homicídio contra pessoa LGBTQIA+ em 2020 -segundo as autoridades não houve assassinato de pessoas dessa população em 2021. Os demais campos relacionados à lesão corporal dolosa e estupro no estado foram classificados como “informação não disponível”.
No caso dos estupros, os estados com maior aumento percentual de registros são Alagoas (500%) e Amapá (500%). Em números absolutos, ambos tiveram aumento de 1 caso para 6. Já o estado de Goiás teve o maior aumento na quantidade de notificações de estupros de LGBTQIA+, passando de 10 para 27, um crescimento de 170%.
A ausência de dados também afeta a qualidade das informações na forma de distorções percentuais. O caso de Alagoas e Amapá, por exemplo, distorce o percentual brasileiro para cima. São 10 casos a mais no período de um ano, quantidade inferior aos 17 casos de Goiás.
“Os dados não nos dizem muito sobre a população. Não dá para comparar esses dados com a população LGBTQIA+ no Brasil de forma precisa porque há esse problema na produção de dados que extrapola o setor da segurança pública.”