Desperdício na Saúde: em apenas 60 medicamentos e materiais incinerados, mais de R$ 14 milhões foram perdidos
O desperdício de 700 toneladas de medicamentos comprados pela Secretaria Estadual de Saúde do Rio — e incinerados por perda da validade — deu um prejuízo milionário aos cofres públicos. O EXTRA teve acesso à lista onde estão relacionados os remédios e materiais médicos jogados fora no ano passado. Na planilha, obtida pela Comissão de Orçamento da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), há 235 itens. Um levantamento do custo médio de 60 deles mostra que R$ 14,3 milhões viraram fumaça. A apuração dos preços foi feita no Banco de Preços em Saúde (BPS) do Ministério da Saúde.
Na listagem, estão milhares de comprimidos para controle da pressão, fitas de medição de glicose, biolarvicida para combate à dengue, luvas, glicose, antibióticos, medicamentos para Parkinson e tuberculose, vitaminas, coletores de urina e até 6 milhões de abaixadores de língua. A comissão da Alerj está investigando a queima dos medicamentos e insumos, que ocorreu entre 2014 e 2015, e foi denunciada pela revista “Veja”.
Outras 300 toneladas de remédios, também já com a validade expirada, mas ainda não incineradas, estão em centrais de abastecimento da Secretaria estadual de Saúde, em Niterói, Região Metropolitana do Rio, e na Pavuna, Zona Norte.
A lista obtida pelo EXTRA é referente às 240 toneladas de medicamentos e insumos que foram incinerados no ano passado. O restante — 460 toneladas — foi queimado em 2014.
A gestão do depósito está a cargo do consórcio LogRio, que tem um contrato de R$ 30 milhões com o governo do estado para a prestação do serviço.
Remédios em falta
O vereador e médico Paulo Pinheiro (PSOL) acredita que o número de remédios incinerados é alto para a rede estadual. Para ele, os medicamentos deveriam ter sido distribuídos pelos postos de saúde no interior do Rio.
— Muitos desses remédios estão em falta na rede básica de saúde das cidades do interior. O Captopril, por exemplo, é usado no atendimento ambulatorial. Por que não distribuir pelas prefeituras? — Questiona.
Para ele, duas hipóteses podem explicar a situação: erro de planejamento ou de utilização:
— Nos dois casos, aconteceu um crime.
Incineração sai cara
Além do dinheiro desperdiçado com medicamentos que perderam a validade sem serem utilizados, o governo do estado ainda vai gastar R$ 2,8 milhões para incinerar medicamentos e insumos hospitalares com prazo de validade vencida. O cálculo é do presidente da Comissão de Orçamento, Fiscalização e Controle, deputado Pedro Fernandes (PMDB), levando em consideração o valor do custo de R$ 2,86 por quilo incinerado, multiplicado pelas 700 toneladas já incineradas no ano passado, somadas às 300 toneladas encontradas em fevereiro na Central Geral de Abastecimento (CGA) da Secretaria estadual de Saúde, em Niterói.
— Estamos pedindo ao governo o bloqueio do pagamento da dívida que o estado tem com as essas empresas. Este montante chega a R$ 59 milhões. Na próxima segunda-feira, vamos ouvir três fiscais que assinaram os contratos. O secretário de Saúde, Luiz Antônio Teixeira Jr., se comprometeu a rescindir o contrato — disse deputado Pedro Fernandes.
A Secretaria de Saúde informou que o consórcio LogRio foi notificado pelo descumprimento de suas obrigações e terá 15 dias para apresentar sua defesa.
Cinquenta mil tratamentos no lixo
Segundo o médico Jorge Darze, presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro, os 2.237.060 comprimidos de Captopril incinerados poderiam tratar 37.284 pacientes por um mês, já que costumasse utilizar duas doses diárias do medicamento. A droga, de uso contínuo, é uma das principais administradas no controle da hipertensão.
— Estamos falando de uma rede que atende milhares de pessoas por dia. Não seria condenável comprar uma quantidade de comprimidos de Captopril para tantas pessoas, mas é preciso correlacionar isso à data de validade do produto — pondera.
O mesmo vale para o Propranolol, outro remédio usado por pacientes com pressão alta, em duas doses diárias. Com os 1.331.000 comprimidos jogados no lixo, 22.183 pessoas poderiam ter feito o tratamento por 30 dias.
Já a ampicilina sódica é um antibiótico utilizado para combater infecções causadas por bactérias na pele e na garganta. De acordo com Darze, o tratamento costuma durar de uma semana a dez dias. Com os 135.840 comprimidos incinerados, 6.792 pacientes teriam sido beneficiados se precisassem de duas doses diárias por dez dias.
Respostas da Secretaria estadual de Saúde
A Secretaria estadual de Saúde informou que o consórcio LogRio terá que explicar o atraso de pagamento de seus funcionários; desabastecimento de material de uso diário; não cumprimento da determinação de descarte do material vencido no ano de 2013 dentro do prazo.
A pasta informou ainda a LogRio terá 48 horas para se manifestar sobre a suspensão cautelar do pagamento. Segundo o órgão, o descumprimento das obrigações pode provocar a rescisão do contrato, podendo acarretar na suspensão temporária de participação em licitação, ou até mesmo a declaração de inidoneidade para contratação com a administração pública, não excluída também a aplicação de multa.
Por Extra