Higienização da Copa: Defensoria aciona prefeitura por remover moradores de rua com jatos d’água
Fabiana Miranda afirma que é requisitada uma indenização por danos morais coletivos de R$ 5 milhões contra a prefeitura e demais autarquias e de R$ 50 mil para cada morador de rua. Porém, o valor deverá ser decidido pelo juiz Ruy Eduardo Almeida Britto, responsável por julgar o caso. Além de levar a denúncia para Justiça, a Defensoria ainda encaminhou um ofício ao Ministério Público (MP-BA) para que apure as infrações cometidas contra a população em situação de rua em Salvador, que atualmente é de aproximadamente 4 mil pessoas. A chamada “prática higienista”, segundo a defensora, tem sido adotada pelos órgãos públicos em razão da Copa do Mundo. As denúncias são apuradas pela Defensoria Pública da Bahia desde setembro do ano passado, mas só em abril deste ano o órgão conseguiu reunir depoimentos e documentos para dar entrada com a medida. “Os moradores de rua têm medo de vir à Defensoria prestar as declarações das violações sofridas. Se as pessoas não tivessem medo, poderíamos ter ingressado com a ação antes, em novembro. As pessoas ainda não têm essa coragem para denunciar”, explica. Miranda conta que, desde que o começo da investigação, foi identificado um comboio com um caminhão da prefeitura, veículos de passeio despadronizados, uma Kombi e um caminhão da Limpurb em circulação, durante a madrugada, para “convidar” as pessoas a entrar na van para serem levadas a abrigos. Segundo os relatos, quem oferece resistência aos convites, sofre agressões físicas. Fica a cargo da Limpurb jogar jatos d'água contra os moradores de rua que se recusam a sair da localidade. Além disso, são retirados pertences, como documentos, cobertores, roupas e sapatos, e jogados nos caminhões como se fossem lixo. A ação foi baseada em depoimentos 12 moradores de rua, que assinaram os termos de declarações. As demais vítimas tiveram medo de represálias.
A denúncia ainda conta com depoimento seis profissionais que trabalham com população de rua em Salvador e que presenciaram ou escutaram relatos dos moradores de rua sobre as violações. Um dos casos é de uma mulher identificada como Júlia, nome fictício para proteger a vítima. Júlia diz que, por volta das 3h da manhã, foi acordada de surpresa. “Além do caminhão-pipa que os molhava, havia outro caminhão, no qual eram colocados seus pertences (colchão, mochila com roupas e documentos, lençol etc). Ambos os caminhões tinham escrito ‘Prefeitura de Salvador’. Havia, também. duas viaturas da Polícia Militar, com policiais militares fardados dentro. Os policiais desceram das viaturas e abordaram as pessoas que lá se encontravam, já molhadas, as ameaçando, com armas em punho, ordenando que fossem embora do local, sem levar nada. (…) Enquanto isso, um homem que desceu do caminhão jogava os pertences das pessoas no dito caminhão. As pessoas que reclamavam, solicitando seus pertences e documentos, eram agredidas fisicamente pelos policiais. Quando abordou um dos policiais solicitando ao menos seus documentos e pedidos de exames, sem sequer solicitar seu lençol ou outras coisas, o policial lhe disse para ir embora. Saiu correndo, pois um outro policial veio em sua direção para agredi-la. Algumas pessoas ficaram feridas, em razão das agressões feitas pelos policiais. Esta tem sido uma prática recorrente, não é a primeira vez que isto acontece. As pessoas que estão nas ruas têm sido molhadas e coagidas, perdendo seus documentos e demais pertences”, detalha um trecho da ação.
A defensora não sabe dizer em quanto tempo o caso será julgado pela Justiça, mas alerta que, quem presenciar agressões como esta pode denunciar tanto na Defensoria Pública, Ministério Público ou pelo Disque 100, central da Secretária de Direitos Humanos que acolhe tais informações. A Defensoria ainda tem notificado órgãos como a Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos; Coordenação-Geral de Direitos da População em Situação de Rua; Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos; Secretaria Nacional de Assistência Social, Comissão de Direitos Humanos da seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), entre outros inclusive internacionais, para que tomem providências. Segundo a defensora pública, a Limpurb e a prefeitura já foram chamadas para conversar, mas negam que as agressões contra os moradores de rua tenham acontecido.