Hospital de Custódia é alvo de pedido de interdição
Eram 9h30 da segunda-feira passada. Um grupo de cerca de 50 homens sai de um imóvel branco de dois andares, gradeado e com poucas janelas. Entre eles, advogados, médicos, dentistas, artistas plásticos, desempregados da capital e do interior. Além de dividirem o mesmo espaço – são internos do Hospital de Custódia e Tratamento (HCT) -, possuem mais um aspecto em comum: cometeram crime.
Mas o que talvez muitos deles não saibam é que a rotina na unidade, na Baixa do Fiscal, pode estar com os dias contados. O HCT é alvo de uma ação de interdição movida pela Defensoria Pública do Estado e, desde o último mês de julho, aguarda decisão da Justiça.
A alegação é que a unidade tem estrutura física “insalubre e inadequada”, além de a “gestão” dos internos não respeitar a lei antimanicomial (10.216/2001).
O HCT faz parte do sistema prisional e executa o cumprimento da medida de segurança de portadores de transtorno mental em conflito com a lei, além de realizar perícias psiquiátricas nos casos de incidentes de insanidade mental dos que respondem ao processo em liberdade e daqueles que tiveram internação provisória decretada.
A unidade tem capacidade para 150 pessoas. Dos 160 internos atuais (145 homens e 15 mulheres), a maior parte (67) cometeu homicídio. Outros 40 tentaram assassinar alguém, geralmente familiares. Outros 12 respondem por lesão corporal; 10, por estupro; e oito, por ameaças.
No entanto, só 54 do total cumprem de fato medida de segurança: os casos dos inimputáveis que ficam até três anos no local e precisam de laudo de cessação de periculosidade para ser liberados. A maior parte (84) tem perícia pronta, mas ainda não teve o caso julgado. Eles foram detidos provisoriamente, mas permanecem na unidade. Outros nove ainda aguardam para fazer o laudo.
Rotina
Durante a visita da reportagem, um deles pergunta: “O senhor é advogado? É o diretor? Meu processo está pronto? Tem que levar para o juiz”, dispara. Outro, sentado, não para de chorar. Alguns andam de um lado para o outro no espaço aberto e arborizado em frente ao imóvel, mas cercado por um muro alto.
Uns jogam dama. Poucos sentam no meio-fio e miram o horizonte. Todos aguardam o horário das 11h, quando retornam para o imóvel para receber medicação e almoçar. Às 14h, são liberados novamente para ficar no espaço aberto até retornarem às 17h e só repetirem a rotina no dia seguinte.
No entanto, essa rotina pode ser interrompida, a depender do julgamento do juiz Antônio Cavalcanti, da Vara de Execuções Penais e Medidas Alternativas do Fórum Criminal, que está com o caso. Ele é o mesmo juiz que, em 2013, já havia interditado a unidade por falta de condições para abrigar os internos. O estado recorreu e conseguiu uma liminar, evitando a interdição.
A defensora Andrea Tourinho alega que a estrutura física ainda é deficiente e que há demora na realização dos laudos periciais dos detidos provisoriamente. “A situação dos provisórios é muito preocupante, ficam um tempo indefinido. É preciso ter mais peritos-médicos para fazer perícia”, disse. No HCT, há seis psiquiatras para fazer a perícia.
Segundo a defensora, o HCT se restringe ao asilamento e aplicação de medicamentos nos internos: “A maioria é portador de esquizofrenia, que é tratável. A gente vê no HCT um tratamento ultrapassado, desumano, porque não há terapia devida. Só medicação”.
Transferência
Segundo o superintendente de ressocialização da Secretaria de Administração Penitenciária (Seap), Luís Antônio Fonseca, já foi decidido que os internos detidos provisoriamente serão encaminhados para um anexo da Cadeia Pública (ver matéria ao lado). O plano é deixar no HCT apenas os internos que estão cumprindo medida de segurança.
Fonseca disse que a unidade passou por uma reforma. “A ideia é não sair mais daqui. As alas foram melhoradas do ponto de vista físico. A leitura da Defensoria é com base na lei antimanicomial que não é para ter HCT, mas a grande situação é onde vamos colocar essas pessoas? Aqui, há 16 internos sem família”, frisou.
Enquanto aguardam decisão judicial, a situação foi debatida em audiências, mas ainda não foi encontrada solução viável para o fechamento do HCT.