Pandemia faz brasileiros assistirem mais pornô, segundo pesquisa
Faz anos que sou assim, mas agora piorou por estar mais tempo em casa. Acho que perdi o interesse de ficar com outras pessoas. Parece que isso me basta. Mas daí vem a sensação de não de não estar aproveitando a vida. É constrangedor. A vontade de ver pornografia é mais forte.”
O relato de Pedro* se refere ao sentimento de estar refém da pornografia. Ele sente a necessidade de assistir vídeos pornográficos na internet tão frequentemente que sua rotina da vida começou a ser prejudicada. Ao perceber que passava tempo demais na busca por esse conteúdo, se sentiu mal, e procurou ajuda de um psiquiatra.
A compulsão por pornografia, segundo ele, ganhou maior dimensão há poucos meses, na pandemia, principalmente por estar mais tempo sozinho em casa. Segundo dados recentes de um dos maiores sites de pornografia do mundo, o Pornhub, o acesso a esse tipo de conteúdo aumentou em tempos de isolamento e distanciamento social. Independente de pandemia ou não, em enquete feita no Campo Grande News, 60% das pessoas disseram que acessaram conteúdo adulto.
Porém, a preocupação de Pedro, dentro do consultório médico é com a mudança de comportamento. “Eu deixei de buscar sexo com outras pessoas. No começo, o motivo era a pandemia, mas agora isso não é que me importa mais. Qualquer conteúdo que instiga é motivo para a masturbação, de manhã, de tarde e de noite”, relata.
Histórias como a de Pedro são comuns nos consultórios de médicos e psicólogos, e a quarentena trouxe um ambiente propício para compulsões por combinar ansiedade e solidão, diz a psicóloga Mariana Breve. E muitas vezes a trajetória como a de Pedro se assemelha à de pessoas que se tornam dependentes de substâncias químicas.
“Quando assistir pornografia interfere ativamente nos afazeres da pessoa, podendo chegar ao ponto de o indivíduo não conseguir mais ter prazer sem o estímulo da pornografia, também aumentando mais e mais a quantidade de consumo ou causando prejuízo físico, pode ser sim considerado um vício”, explica a psicóloga.
Na pandemia, a solidão e a ansiedade podem ter aumentado esses quadros, avalia a especialista. “Pessoas sozinhas, solitárias, muitas vezes ansiosas estão tentando obter algum prazer físico com tempo livre em casa. E há algum tempo, consumir pornografia tornou-se muito fácil, literalmente na palma da mão.”
E os motivos que levam ao consumo também são diversos. “Pode ser que vá muito mais além de simplesmente induzir ao prazer físico e sexual. Ela [pornografia], quem sabe, sirva para também para dar nome às fantasias e desejos que não podem ou não consigam ser vividos na vida real.”
Mas a perda de noção de realidade, a sensação de estar distante do outro e a mudança de rotina devem ser motivos de preocupação, alerta a psicóloga. “O que se consome por pornografia hoje é uma caricatura grotesca do que é o sexo que vai ser feito aqui fora; o consumo exagerado de pornografia, em muitos casos, pode fazer com que haja uma diminuição da satisfação sexual, já que expectativas altíssimas foram criadas baseadas no que se assistiu. Por isso, deve-se prestar atenção quantas vezes precisa consumir este tipo de conteúdo e se isso está afetando outras áreas da vida, como emocional, afetiva e financeira”, alerta.
E o próprio conteúdo que se consome dentro da pornografia deve ser objeto de atenção, acrescenta. “Pois além da objetificação das mulheres, há crimes como pedofilia e estupro documentados como pornografia.”
Sobre limites para consumo da pornografia, Mariana explica que essa é uma discussão muito antiga e longa nas áreas da saúde mental. “Normal dentro da normalidade de cada um, que não afete áreas da vida, é a receita. O que não se pode normalizar é o consumo de conteúdos pornográficos criminosos, machistas, homofóbicos ou transfóbicos.”
Em casos de sensação de impotência, prisão e quadros de desespero quando a pessoa acha que perdeu o controle, o ideal é buscar ajuda. “Conversando com profissionais da saúde mental, seja psicólogo ou psiquiatras, sendo honesto ou honesta consigo e com estes profissionais. Não há porque ter vergonha de tratar disso com profissionais, somente falando sobre é que algo mudará.”
Campo grande News