Presidente da CPI diz já ter prova de dolo de Bolsonaro contra vacina
O presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz, do PSD do Amazonas, já vê elementos para responsabilizar Jair Bolsonaro por omissão no combate à pandemia, que já matou quase 450 mil brasileiros.
Aziz afirmou, em entrevista à coluna, que, em sua avaliação, os depoimentos prestados até agora já mostram que Jair Bolsonaro “nunca quis comprar vacinas”.
A avaliação de Aziz deu um passo além no que ele vinha afirmando nos últimos dias, em que ele criticara o governo, mas ainda não afirmara categoricamente ver que as primeiras semanas de investigações já provaram a responsabilidade de Jair Bolsonaro na tragédia da pandemia.
“A declaração de Pazuello de que falava com o presidente uma vez na semana ou a cada 15 dias demonstra claramente o ‘grande’ empenho que eles tinham para combater a Covid. Se eu fosse presidente, meu gabinete iria para o Ministério da Saúde. Ora, (se) eu estou numa guerra, (eu faria isso). Como é que pode o Pazuello dizer isso? Que conclusão você tira disso? Nunca quiseram a vacina”.
eia os principais trechos da entrevista:
O que a CPI já constatou sobre a conduta do governo na pandemia, com mais de 440 mil mortos por Covid?
Está comprovado que a gente nunca teve um planejamento para enfrentar a pandemia. Tudo era feito no acaso, principalmente o que houve em Manaus, onde tentaram criar um aplicativo e deu no que deu. Manaus foi usada como cobaia. Isso é brincadeira! A gente identificou que eles apostavam no tratamento precoce, e não na vacina. Nunca foi intenção comprar vacina. Foi o grande erro do governo. Enquanto o mundo apostava na vacina, o Brasil apostava no tratamento precoce, imunização de rebanho e protocolos que não funcionaram.
Já está caracterizada ao menos uma omissão do presidente Bolsonaro?
A declaração de Pazuello de que falava com o presidente uma vez na semana ou a cada 15 dias demonstra claramente o “grande” empenho que eles tinham para combater a Covid. Se eu fosse presidente, meu gabinete iria para o Ministério da Saúde. Ora, eu estou numa guerra. Como é que pode o Pazuello dizer isso? Que conclusão você tira disso? Nunca quiseram a vacina. No lugar do presidente, eu ligava para os EUA, União Europeia, pegava um avião para a China atrás de insumo. 80% das nossas commodities vão para a China. Como é que não negocia? Eu fui governador. Quando havia uma rebelião em prisão, eu falava com o secretário de Segurança 50 vezes ao dia.
Como a CPI responsabilizará autoridades?
O presidente não acordou e disse que cloroquina salva, que não precisa de isolamento social e defendeu imunização de rebanho. Alguém colocou isso na cabeça dele. Por isso, perguntamos tanto sobre esse ministério paralelo. Descobrimos que tentaram mudar até a bula da cloroquina (na verdade, o fato já era de conhecimento público antes da CPI). Você tem que chegar a quem orientou o presidente. Flávio Bolsonaro disse, num tom jocoso, que o presidente era orientado pelo pastor Silas Malafaia.
Mas, ao atribuir esse aconselhamento pró-cloroquina a pessoas que não são autoridades do governo, como a médica Nise Yamaguchi ou, mesmo que em tom jocoso, Silas Malafaia, não estariam os depoentes governistas querendo proteger Bolsonaro ou salvar a própria pele?
Já sabemos quem estava nessa reunião para mudar a bula da cloroquina: o Jorge Oliveira (ex-ministro da Secretaria Geral da Presidência e atual ministro do TCU), o general Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e atual ministro da Defesa), a doutora Nise Yamaguchi e outro médico cardiologista. (Foi) quando o presidente da Anvisa disse que não faria aquilo nunca. E o Braga Netto disse: ‘Não, isso é só uma coisa’, e tirou por menos. Mas, se o presidente da Anvisa tivesse topado, hoje a bula da cloroquina estaria como se servisse para Covid. Quem determinou isso? Temos que ir atrás.
Que tal o depoimento de Eduardo Pazuello?
Ele foi preparado para ter uma versão de que um manda e o outro obedece (em relação a Jair Bolsonaro). O media training dele foi craque. Queria fazer um desses também! Ele inocenta o presidente de qualquer ação, mas acho que os fatos falam por si. O que ele deu foi uma versão, e essa versão não são os fatos. Não dá para esconder os fatos durante o tempo que ele passou no ministério e as declarações de Bolsonaro.
Por que essa versão não se sustenta?
Nenhuma versão dele se sustenta. Vale também uma acareação entre ele e o Fabio Wajngarten. Em 2 de setembro, Pazuello recebeu um documento da Pfizer. Dois meses depois, segundo disse o Wajngarten, o dono de uma rede de TV (Marcelo de Carvalho, o dono da Rede TV!) ligou para Wajngarten e disse que a Pfizer havia enviado o documento, sem resposta. Ora, não era o Pazuello que estava negociando as vacinas? Por que o Wajngarten também estava negociando? Havia duas frentes de negociação? O Ministério da Saúde e a Secretaria de Comunicação da Presidência, que não tinha nada a ver com isso? O Ministério da Saúde respondeu documentos sem levar nada para a frente. Alegaram que não negociaram com a Pfizer num primeiro momento porque o contrato era leonino. Mas, depois, assinaram o contrato da mesma forma. Mas não podemos esquecer que o presidente Bolsonaro disse publicamente a seguinte frase: ‘Não, o Brasil tem 210 milhões de habitantes, eles é que têm o interesse de nos vender a vacina, não somos nós’? Isso é brincar com a vida.
Senadores tiveram cautela excessiva com Pazuello, por se tratar de um general?
Não acho. Senadores chamaram o Pazuello de “ajudante de ordens”, de “mentiroso” centenas de vezes. Pelo habeas corpus, ele tinha de ser tratado com respeito. O habeas corpus não era só para Pazuello não se incriminar.
Como foi sua conversa com o comandante do Exército, general Paulo Sérgio?
Antes do primeiro depoimento, eu liguei para o comandante do Exército e disse que quem falaria à CPI não seria um general, mas um ex-ministro da Saúde. Isso foi para não misturarmos as coisas. Uma coisa é o Exército, e outra é o Pazuello. Ele concordou. No dia seguinte, o comandante do Exército me ligou dizendo que o Pazuello havia tido contato com dois assessores contaminados com Covid. Um senador quis pedir o exame, mas eu recusei. Não vou desrespeitar um general. O comandante do Exército vai mentir para mim? Não posso duvidar da palavra do comandante. Se fosse o Pazuello, era outra coisa. Um dia antes de Pazuello depor, na última terça-feira, eu liguei novamente. Perguntei ao comandante se Pazuello iria à CPI fardado. O comandante negou e disse que já havia conversado com Pazuello.
Há possibilidades concretas de a CPI quebrar sigilo de autoridades? Eduardo Pazuello e Ernesto Araújo estão na lista.
Sim.
O senhor negou a prisão de Fabio Wajngarten, quando ficou comprovado que ele mentiu. O senhor é totalmente contrário a prender depoentes que mintam na CPI?
Não mesmo. Naquele momento, Wajngarten dava uma grande contribuição à CPI. Ele trouxe a carta que foi entregue a seis pessoas do governo. Se eu aceito a prisão naquele momento, a CPI acabava naquele dia. O STF daria o direito de as pessoas não prestarem depoimento. Ninguém iria mais depor. Veja bem como as coisas mudam. Você acha que o Lewandowski ficou satisfeito com o habeas corpus que deu ao Pazuello depois que viu o depoimento dele? Acho que não. Com o habeas corpus, o cara foi lá e mentiu, fez o que quis, tentou desmoralizar a CPI. Lewandowski concedeu ao ex-ministro o direito de ficar calado para não se incriminar. O que Pazuello disse? Que responderia a todas as perguntas, com a versão que queria, mentindo descaradamente. Qualquer criança viu que ele estava mentindo. Ninguém é menino ali.