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24 November 2024
Gil Vicente diz que "erro começa no edital e termina no artista" (Foto: Mila Cordeiro/A Tarde)

Sem recursos públicos, teatro baiano caminha na corda bamba

Quinze anos depois de ter começado a revelar ao país astros como Wagner Moura, Lázaro Ramos,  Vladimir Brichta e, posteriormente, Laila Garin,  o teatro baiano ainda está longe de se firmar como um mercado de trabalho para atores, dramaturgos e técnicos. E o problema não é só o desinteresse do público pela maioria das encenações locais.

Quem avalia é o dramaturgo e professor universitário Gil Vicente Tavares, que acaba de encerrar uma temporada de sucesso de Sade, peça com ingressos esgotados em 13 das 24 sessões realizadas. E não está feliz com o modelo  de produção teatral na Bahia.

“Há um problema em toda a cadeia produtiva, que começa nos editais e termina no artista. Hoje em dia, o objetivo do edital é dar dinheiro para o artista”, afirma Tavares, cuja última peça, um texto de conclusão do mestrado, foi contemplada em 2014 com cerca de R$ 90 mil do Fundo de Cultura, que destina uma parte  da arrecadação do estado com ICMS para apoiar produtos culturais baianos.

Tavares considera que os critérios adotados na definição dos contemplados são injustos por igualar pessoas e projetos díspares. “O Setorial de Teatro, um balaio de gato proposto pela Secult, onde aspirantes e mestres, festivais e montagens, oficinas e circulações concorrem em pé de igualdade”, afirma.

Desde 2012, o Setorial de Teatro da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Funceb) define os projetos beneficiados, que se comprometem, em contrapartida, a realizar 24 apresentações.

“O sujeito põe a peça três semanas, de quinta a domingo, para ninguém assistir e não é cobrado por isso”, declara o dramaturgo, que defende a necessidade de uma peça ficar em cartaz por pelo menos três meses,  a fim de  ser comentada e gerar interesse na sociedade. A culpa do artista, por sua vez, estaria em uma suposta falta de ambição, que o levaria a produzir trabalhos que não se sustentam.

“Os teatros acabam liberando pautas de três semanas, fazendo com que, ao longo do ano, dezenas de espetáculos passem pelo espaço, não fidelizando um público, não criando uma regularidade, e, consequentemente, acaba que o artista finge que entra em temporada, o teatro finge que movimentou a cena local com diversos espetáculos, e ao fim do ano parece que nada aconteceu de fato na cidade”, afirma Gil Vicente.

O coordenador de teatro da Funceb, Rodrigo Figueiredo, afirmou não entender completamente as críticas de Tavares. “Ele tem reclamado do modelo, mas não há um viés de exclusão nos editais, que têm o objetivo de descentralizar o fomento à cultura, na capital e no interior”, afirma Figueiredo, que está à frente da coordenação desde 2012.

O edital de teatro não foi publicado este ano, por conta  do corte no orçamento do governo estadual, em função da crise, mas deve voltar no ano que vem, com o mesmo montante de 2014. Cerca de R$ 2 milhões.

Em um estado em que boa parte da produção teatral depende do apoio oficial, por meio do Fundo de Cultura (recursos do ICMS) ou do FazCultura e da Lei Rouanet (dedução no Imposto de Renda de empresas patrocinadoras), os critérios de aplicação do financiamento têm um impacto direto no que vai ser o mercado de trabalho em teatro.

Parte do elenco de Sade, Marcelo Prado vive das artes cênicas e, eventualmente, complementa a renda com peças corporativas, encomendadas por empresas interessadas em  dramatizar para os funcionários questões de segurança ou   aspectos de comportamento. “Esse mercado foi importante por volta do ano 2000, mas, com a perda de visibilidade do teatro baiano, as empresas pararam de usar esse recurso”, afirma o ator, que não é muito otimista em relação a quem está começando a carreira. “Talvez seja melhor buscar trabalho em outras cidades”, avalia.

Saiba onde obter apoio financeiro:

Fundo de cultura – Destina R$ 2 milhões da arrecadação do ICMS para apoiar o teatro. Coordenado pela Funceb, volta a vigorar em 2016;

Fazcultura Estipula abatimento no IR de empresas que patrocinam cultura; 

Teatro empresarial – Algumas empresas contratam profissionais de teatro para escrever e atuar em histórias voltadas para o público interno;

Por Gilson Jorge/A Tarde