Trabalho infantil ainda está ‘bastante enraizado na nossa sociedade’, diz especialista
Apesar da Lei de Aprendizagem ajuda a prevenir trabalho infantil e ressocializar jovens infratores (clique aqui e leia), um dos maiores desafios no combate ao trabalho infantil no Brasil, segundo o coordenador de combate ao Trabalho Infantil da SRTE na Bahia, Antônio Inocêncio, é que a prática está enraizada na sociedade brasileira. “Há uma questão cultural ainda muito forte, de valorização do trabalho. A família não acha que esteja fazendo mal a criança, e as crianças não acham que estão sendo exploradas. O patrão, em muitas áreas, não acha que está explorando. É uma questão cultural que precisa ser bem trabalhada em uma rede de proteção à criança. Não só fiscalização, mas também educação e saúde em um trabalho articulado”, observa. De acordo com dados de uma Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio (Pnad), e publicados no site Observatório da Criança, aproximadamente 296 mil crianças e adolescentes baianas, entre 5 a 17 anos, estão em situação de trabalho. A pesquisa, divulgada no início do último mês de abril, ainda aponta que a exploração do trabalho infantil no país cresceu 4,5% em 2014, comparada a 2013. Em 2013, na Bahia, a pesquisa registrou quase 292 mil crianças trabalhando. Para a procuradora do Trabalho Virginia Senna, desde o início da década de 1990 a visão de que o trabalho infantil é benefício se modificou. “No início, a gente lutou muito com relação a isso, e eu acho que a sociedade já vem tendo uma outra opinião sobre isso. O trabalho infantil, na verdade, só faz recrudescer o ciclo de miséria e exclusão social, na medida em que não proporciona a transformação social. A criança não vai para escola, se submete ao trabalho e ai não avança e o ciclo vai se perpetuando. Além do mais, existe todo um estudo de que o trabalho infantil é maléfico ao desenvolvimento da saúde física e mental do menor. Imagina um menor carregando peso, o mal que isso causa”, ressalta. Inocêncio explica que são inúmeros os prejuízos para a criança que começa a trabalhar cedo. “A criança é prejudicada fisicamente e psicologicamente em seu desenvolvimento. A criança interpreta questões habituais do trabalho de uma maneira diferente do adulto, ela ainda não está segura para entrar no mercado de trabalho. Para a sociedade, existe a manifestação do ciclo da pobreza. A criança que trabalha precocemente dificilmente irá se qualificar, estudar, ter uma possibilidade melhor de trabalho no futuro. Ou seja, ela permanecerá na pobreza, não será promovida no trabalho precoce, embora parte da sociedade defenda que trabalhando desde cedo ela tem mais chance de prosperar. Não se qualificando, essa criança se tornará uma mão de obra pouco preparada. Em uma economia que almeje o progresso, o ideal é ter uma mão de obra cada vez mais qualificada. Não é o que acontece quando a pessoa começa a trabalhar desde cedo. Ela para de estudar, ou não tem condições de manter os estudos no mesmo nível. A energia é toda gasta no trabalho”, avalia. O Brasil tem até o ano de 2025 para erradicar as piores formas de trabalho infantil. Contudo, a crise econômica pode acentuar o trabalho infantil, por conta das demissões dos pais, aponta Senna. Ela diz que o momento é difícil até para se cobrar que as empresas cumpram a Lei de Aprendizagem. Ainda de acordo com a procuradora, o MPT recebe muitas denúncias de crianças e adolescentes que trabalham nas ruas, muitas vezes para os próprios pais, e que o combate é feito com apoio dos órgãos de fiscalização, como o Conselho Tutelar, que carecem de maior estrutura.
BN