veja vídeo Idosa morre dois dias após sofrer ataque de abelhas em casa, no Barbalho
De janelas e portas fechadas, com medo. É assim que estão vivendo os moradores do Loteamento Lanat, no Barbalho, em Salvador. Na última sexta-feira, por volta das 15h, os moradores da região foram vítimas de um ataque de abelhas. Picada por centenas delas no quintal de casa, a aposentada Igna Santos, 74 anos, conhecida como Ninha, não resistiu.
Dona Igna, que é irmã de Ubirajara Tavares Gomes, conhecido como Bira do Jegue, morreu no último domingo, no Hospital Ernesto Simões Filho, no Pau Miúdo, onde estava internada. A Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) foi procurada, mas não informou a causa da morte da aposentada. O Samu, que a socorreu, não forneceu mais informações sobre o atendimento. O CORREIO não conseguiu confirmar a causa da morte, mas teve acesso a imagens que mostram a idosa com picadas na região do rosto, cabeça, braços e pernas.
O problema com as abelhas não é novidade para os moradores da região. No mesmo dia em que dona Igna foi atacada, as abelhas invadiram cinco casas na Rua Ibirapuera, no Barbalho, e outros moradores foram ferroados.
Obras
Os ataques começaram, segundo os moradores, depois que trabalhadores de uma obra na região atingiram uma colmeia. A obra é do Atacadão Atakarejo, que está sendo erguido no local.
Procurada, o Atakarejo informou, por meio de nota, que “estava ciente de que a região tinha uma grande incidência de abelhas”, mas que “o fato ocorrido não tem nenhuma interferência direta com a empresa”. “O Atakarejo lamenta bastante o incidente e ressalta ainda que este não aconteceu dentro do local onde está sendo realizada a obra”, diz a nota.
Antes do ataque fatal a dona Igna, uma pessoa foi picada há cerca de um mês. “Estava no quarto e senti a picada de uma abelha. Quando fui fechar a janela, vi várias delas vindo em direção à casa”, contou o estudante que se identificou como Alexandre, 18. Ele e a irmã, Ana Gabriela, 20, contaram que, naquela ocasião, informaram o caso à empresa responsável pela obra.
“Ela morreu por negligência. Eles sabiam”, disse Ana Gabriela. “Eu nunca vi uma coisa daquela, era coisa de filme, os médicos disseram que deviam ser umas 500 picadas”, completou.
A jovem estava chegando em casa no momento do ataque e foi impedida de se aproximar da casa de dona Igna, ao ser alertada por outros moradores. “Não me deixaram descer. Quando a vi, ela já estava entrando na ambulância, completamente inchada”, relatou.
Moradora da mesma rua, a aposentada Tereza Ferreira, 86, foi picada na região dos olhos, queixo e orelhas. “Foi uma correria, todo mundo fechando as casas, tentando se proteger. Não tinha como ajudá-la”, explicou.
Um dos moradores que ainda tentaram ajudar a socorrer Igna, o vidraceiro Rosemberg Nascimento, 58, contou que se assustou com a quantidade dos insetos. “Me cobri com um lençol e fui fechar o fundo da casa, quando a vi. Pensei em sair, mas não tinha como entrar no meio das abelhas. Foi quando joguei um lençol para ela e fiquei dizendo para ela abrir o chuveiro do quintal”, contou.
A idosa ainda tentou seguir as instruções dos vizinhos e chegou a se molhar, se cobrir com lençol e com um saco plástico entregue por outro vizinho. Apesar das tentativas, dona Igna não resistiu e faleceu dois dias depois.
Preocupação
A morte da moradora deixou a comunidade com medo e preocupada. A conciliadora judicial Maria Cristina Santos, 52, tem se precavido: “Eu não abro mais as janelas. Tá todo mundo triste e com medo. Tem gente saindo daqui”.
A dona de casa Maria José Ferreira, 49, conta que os próprios moradores buscaram uma solução. “Chamamos uma empresa na quinta, e ela levou o orçamento para os responsáveis pela obra”, explicou. Segundo os moradores, o orçamento apresentado para o serviço de retirada da colmeia era de R$ 800, mas o valor foi recusado pelos responsáveis pelo empreendimento. No dia seguinte à recusa, houve o ataque a dona Igna.
Segundo os vizinhos, a colmeia foi retirada no sábado. Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde informou que, em razão das abelhas não transmitirem doenças, não é feito um controle dos insetos em Salvador e não há um registro de quais bairros tiveram mais ataques.
O corpo de dona Igna foi sepultado nesta terça-feira (12) à tarde no Cemitério Municipal de Plataforma, no Subúrbio.
Polícia Ambiental não remove os animais
Um dos problemas enfrentados por quem sofre um ataque de abelhas é, depois do transtorno à saúde, conseguir se livrar da colmeia, que acaba continuando no local onde houve o ataque.
Em Salvador, quem precisa “se livrar” de abelhas acaba tendo que contratar uma empresa especializada na remoção dos animais. No caso dos moradores do Barbalho, onde aconteceu o ataque na sexta-feira passada, o orçamento para o serviço ficou em torno R$ 800 – o que corresponde a 80% de um salário mínimo.
A Polícia de Proteção Ambiental (Coppa), ligada à Polícia Militar da Bahia, órgão comumente chamado para fazer a remoção dos animais, informou, por meio de nota, que não é responsável por fazer o manejo dos animais sinantrópicos – aqueles que se adaptam à vida entre humanos, como abelhas, cupins, formigas, pulgas, piolhos, mosquitos, moscas e outras espécies nocivas.
Em nota ao CORREIO, a Coppa informou que tem como missão “coibir crimes ambientais” e que “não compete à referida unidade da Polícia Militar fazer o manejo de animais sinantrópicos – a exemplo de abelhas, conforme Instrução Normativa do Ibama nº 141/2006”.
Apesar do posicionamento da companhia, o documento do Ibama diz que “fica facultado aos órgãos de segurança pública, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil, o manejo e o controle da fauna sinantrópica nociva, sempre que esta representar risco iminente para a população”.
A mesma instrução assegura que pessoas físicas e jurídicas habilitadas possam fazer o controle desses animais, sem a necessidade de autorização do Ibama.
Em 2016, o Ministério Público da Bahia expediu uma nota técnica orientando promotores e órgãos públicos a respeito do manejo das chamadas abelhas africanizadas, por representarem risco à saúde pública.
O que o veneno das abelhas pode provocar no corpo humano?
Efeitos do veneno – A histamina, a melitina e outras enzimas conhecidas como hialuronidase e fosfolipase presentes no veneno das abelhas provocam a queda da pressão. O veneno destrói glóbulos vermelhos. Abelhas ‘enfurecidas’ podem provocar a morte. As informações são da Fiocruz.
– Efeito neurotóxico: O veneno atua sobre o sistema nervoso.
– Efeito hemorrágico: Aumenta a permeabilidade dos capilares sanguíneos.
– Efeito hemolítico: Destrói os glóbulos vermelhos.
Reações à picada
– Dor forte durante os primeiros dois a três minutos, proporcional ao número de ferroadas recebidas.
– Inchaço mais ou menos acentuado.
– Vermelhidão no local.
– Coceira no local, podendo atingir todo o corpo.
– Aumento de temperatura corporal, principalmente no local.
– Dificuldade para respirar.
– Cor azulada nos lábios (casos de alergia).
– Vômito e perda de consciência (casos de alergia).
Recomendações
– Não mexer com abelhas se não for apicultor ou não tiver conhecimento.
– Não mexer em dias chuvosos – as mais agressivas estão na colmeia.
– Não chegar perto das abelhas sem devida proteção.
– Usar vestuário limpo e sem cheiro desagradável às abelhas.
– Evitar esmagar abelhas, pois o cheiro do veneno se espalhará entre as demais, motivando uma reação agressiva.
– Estudar a biologia delas e seguir as orientações de um técnico.
– Não atacar as abelhas.
– Usar roupas brancas e de origem vegetal, como algodão. Lã motiva a agressividade.
– Evitar movimentos bruscos, porque as abelhas enxergam com facilidade objetos em movimento.
– Usar chapéu ou cobrir o cabelo com um pano, pois elas são atraídas por óleos e perfumes.
Fui picado. E agora?
– Retire o ferrão, sem apertar a bolsa do veneno, para que ele não se espalhe.
– Aplique gelo no local inchado.
– Evite esfregar o local da picada.
– Evite tomar banho ou passar álcool no corp, para não aumentar as reações.
– Procure assistência médica.
*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier e da subeditora Clarissa Pacheco